O historiador André S. Muceniecks - membro do NEVE - visitou o sítio escandinavo de Grobina, na Letônia, como parte de suas pequisas para o doutorado em História Social pela USP. Muceniecks é pesquisador da presença nórdica na área báltica há muitos anos, tendo apresentado seus trabalhos no Brasil e Inglaterra. A seguir, apresentamos o relato das suas investigações de campo nesta região.
Em julho de 2013 estive em Grobiņa, Letônia, com ajuda de custo da Universidade de São Paulo. O local foi escavado inicialmente por Birger Nerman, que publicou diversos trabalhos (destacam-se Die verbindungen zwischen Skandinavien und dem Ostbaltikum in der jüngeren eisenzeit, de 1929 Grobin-Seeburg; Ausgrabungen und Funde, de 1958), nos quais identificava-o com a Seeburg narrada na Vita Anskarii.
Grobiņa é identificada diversamente, dependendo do autor, como colônia ou entreposto comercial escandinavo, usualmente associada ao período inicial de expansão e exploração escandinavas para o leste, desde antes do século VIII. A cidade contém os maiores cemitérios escandinavos encontrados fora da Escandinávia, uma colina fortificada do período viking (que foi usada até o medievo) e um cemitério neolítico.
Através dos trabalhos de Nerman foi possível discernir duas presenças escandinavas principais: os Svear, militarizados, e outro povoamento, contendo inclusive enterramentos de mulheres e crianças, com achados mais similares à Cultura Material de Gotland.
1) A colina fortificada
Figura 1
Figura 2
A colina fortificada dos Svear encontra-se em meio ao rio Alānde, cercada de água por todos os lados (menos o da entrada) e dominando a passagem:
Figura 3: Vista do rio Alānde
Figura 4: Entrada da colina – vista do alto
Figura 5: Vista geral da colina fortificada
Figura 6: Espécie de fosso, já bastante aterrado
Figura 7: Encosta
Figura 8: Encosta da colina – a subida é mais íngreme do que parece à primeira vista
Figura 9: Vista da encosta da Colina fortificada, do meio da mesma
Figura 10: Alto da colina fortificada
O local foi reutilizado pelas ordens militares germânicas que conquistaram o Báltico posteriormente.
2) Os cemitérios
De fato, a presença escandinava é forte em Grobiņa, mas as pesquisas mais recentes, conduzidas principalmente por Ingrida Virse e Inga Doniņa, demonstram que o grau de associação com os curônios locais é maior do que se depreende pela leitura exclusiva de Nerman. Uma visão interessante sobre a relação mista entre curônios (“kurir”) e escandinavos, ora de associação, ora de disputa, pode ser vislumbrada na Egilssaga, no capítulo 46.
A área do cemitério escandinavo é bastante ampla, e passa desapercebida para quem não sabe que há algo por ali, tanto que foi construído uma espécie de hipódromo no local, circundada por florestas em diversos pontos.
Há mais de um cemitério, incluindo enterramentos pré-históricos, enterramentos escandinavos, curônios e mistos. Encontram-se cercados por fitas brancas, já que o local foi tombado pela UNESCO. Contém algumas placas indicativas em letão e inglês.
Figura 12: Placa na fronteira sudeste do cemitério escandinavo de Priediena
Figura 13: Indicação na área norte do cemitério escandinavo de Priediena
Figuras 14 e 15: Áreas sobre o antigo hipódromo, agora tombada pela UNESCO e demarcada
Figuras 16 e 17: Fronteiras do cemitério dentro da floresta
Figura 18: Alguns tumuli visíveis
Alguns locais de enterramento encontram-se ao ar livre, sem maiores demarcações, sendo difícil discernir os locais. De fato, há um grande número de locais antigos de enterramentos, e a urbanização da cidade deu-se sem notá-los.
Figura 19: Área urbanizada circundada pelos cemitérios
Figura 20: Parte do campo de enterramentos curônios, com algumas áreas residenciais por cima
3) O material arqueológico:
O material arqueológico escavado tanto em Grobiņa quanto em regiões próximas (Taši, por exemplo) encontra-se depositado no museu de Liepāja. Há uma quantidade considerável de material escandinavo, incluindo broches, espadas e uma estela pictórica proveniente de Gotland, escavada por Petrenko em 1987, publicada no Fornvännen número 86 (de 1991, no qual sua interpretação foi corrigida por Lamm) e bastante gasta. Existem outros três principais exemplares desta modalidade de estela na Escandinávia, que foram estudados por Nylén e Lamm, e são considerados “artigos de exportação” de Gotland.
Figura 21: Ficha catalográfica da estela pictórica. Contém as duas interpretações, de Petrenko (a imagem no alto da estela seria um barco) e de Lamm (a imagem seriam dois patos). A interpretação de Lamm é mais aceita, pois se baseia na comparação com as outras três estelas encontradas na Escandinávia.
Figura 22: A estela pictórica
Figuras 23, 24 e 25: Alguns achados escandinavos selecionados de Grobina, antes em exposição e agora no depósito do Liepājas muzejs. As espadas enquadram nos tipos S, T ou U de Petersen segundo nossa avaliação rápida e se beneficiariam de um estudo mais aprofundado.
Leitura sugerida:
NERMAN, Birger. Die verbindungen zwischen Skandinavien und dem Ostbaltikum in der jüngeren eisenzeit. Stockholm, 1929.
NERMAN, Birger. Grobin-Seeburg; Ausgrabungen und Funde. Stockholm, 1958.
PETRENKO, Valerij Petrovich. A Picture stone from Grobin (Latvia). In: Fornvännen 86 (1991).
PIERCE, Ian. Swords of Viking age. Boydell Press, 2002.
VIRSE, Ingrida Liga & RITUMS, Ritvars. Grobiņa complex of dwelling locations and burial sites, and related questions. In: Archaeologia BALTICA 17 (2012).