terça-feira, 7 de abril de 2020

O pintor alemão que popularizou Wagner e os Vikings





Ferdinand Leeke, A valquíria, pintura em óleo, s.d.





Prof. Dr. Johnni Langer (UFPB/NEVE)




Hoje, dia 7 de abril, completam-se 161 anos do nascimento de Ferdinand Leeke, o genial pintor responsável por popularizar as óperas de Richard Wagner, além de executar várias obras que também disseminaram muito o imaginário sobre a mitologia germânica e os Vikings.

Leeke nasceu em Burg (Magdeburgo) em 1859 e morreu em Nurembergue em 1937. Estudou na Academia de Belas Artes de Munique. Em 1889-1898 ele foi comissionado por Siegfried Wagner (filho do famoso compositor) para realizar dez pinturas sobre o Anel do Nibelungo. As obras foram reproduzidas pelo então revolucionário processo de reprodução fotográfica de Franz Hanfstaengel, gerando uma grande popularidade destas imagens até o início do século XX. Lembramos que os libretos de óperas durante o Oitocentos não continham imagens, algo que só veio a ocorrer (no caso wagneriano) com o ilustrador Arthur Rackham em 1910 (na Inglaterra).

Leeke se torna o artista alemão mais famoso vinculado à representações visuais do ciclo nibelungiano, levando em 2016 o Museu Richard Wagner (Bayreuth, Alemanha, a “meca” dos wagnerianos) a realizar uma grande exposição sobre suas obras.

Além das óperas wagnerianas, as pinturas de Leeke tiveram como tema a Mitologia Germânica, o folclore e a História da Alemanha, a literatura arturiana, a Mitologia clássica, temas e mitos medievais, o cotidiano e a vida dos germanos antigos e também cenas relacionadas aos Vikings.

Primeiramente, comentaremos de forma breve algumas obras envolvendo o Anel do Nibelungo e depois suas telas com temática nórdica.








Wotan e Brunhilde, 1889 a 1898;

Siegfried e Fafnir, 1889 a 1898;

Valquírias, 1889 a 1898.



As pinturas de Leeke reproduzem um visual criado primeiramente por Carl Emil Doepler ainda nas primeiras apresentações das óperas de Wagner do ciclo nibelungiano, nos anos 1870: elmos com grandes asas laterais, escudos de metal, placas de armadura e detalhes anelares (influenciados pelas descobertas de objetos da Idade do Bronze, mesclados fantasiosamente com o período da Idade do Ferro). Tanto os elmos com asas (surgidos na arte escandinava em 1830) quanto o elmo com chifres (surgido na arte alemão em 1852) sugeriam uma liderança de alguns heróis germano-escandinavos (como Frithiof ou Arminius) quanto do poder de deuses (como Tyr). Mas na obra wagneriana, eles são genericamente incorporados aos deuses e valquírias. O tema das guerreiras ocupa uma posição central na obra de Leeke: ele executou várias pinturas de Wotan junto a Brunhilde, com fortes cores e intensa tragicidade romântica. Outro tema também muito retratado por este artista é Siegfried, geralmente opondo-se ao dragão, com vestimentas grosseiras e em ambiente primitivo (uma ideia geralmente associada aos germanos antigos), expressando o poder ancestral dos tempos passados.






Uma invasão viking, 1908 (pintura a óleo).



A pintura mais famosa de Leeke retratando vikings. A exemplo de diversas imagens depois dos anos 1880, a embarcação nórdica possui detalhes bem fidedignos, devido à descoberta do navio Gokstad em 1880 e de Oseberg em 1903. Os nórdicos aqui foram representados nas formas clássicas dos estereótipos relacionados aos Vikings no Oitocentos (em sua forma negativa): piratas predadores, queimando, roubando e estuprando. O detalhe da abdução/estupro é o mais relevante: três mulheres são capturadas e uma delas aparece em primeiro plano. O estereótipo fantasioso do estupro (ver Langer, 2017a) foi popularizado anteriormente na arte pelo francês Évariste Vital Luminais em seu famoso quadro Pirates Normandes (1894). Outro detalhe muito interessante de observar neste quadro é a ausência de asas ou chifres laterais nos elmos (algo que Leeke havia inserido em suas pinturas nibelungianas). Neste caso, o pintor preferiu seguir a tendência dos pintores escandinavos em geral, que dos anos 1850 a 1900 seguiram esta tendência de elmos sem protuberâncias, ficando para os pintores ingleses e norte-americanos a continuidade do famoso estereótipo dos chifres.






Vikings saqueando, 1911.



Nesta pintura, menos conhecida e reproduzida que a anterior, Leeke retorna ao tema dos nórdicos saqueando e abduzindo mulheres – novamente, com cabelos escuros e vestimentas brancas, destacando-as na tela. Também a embarcação volta a ser um dos elementos principais da pintura.






Germanos bebendo debaixo de um carvalho, 1920.



Germanos (Vikings?) jogando dados, 1925.



Ferdinand Leek também realizou várias pinturas retratando cenas cotidianas dos antigos germanos, especialmente bebendo cornos de hidromel (ou cerveja) abaixo de carvalhos. Como em suas representações de Siegfried, os germanos são retratados com vestimentas grosseiras e peles animais – sugerindo uma idéia de primitivismo, mas também, de um povo festivo e idílico – sugerindo uma conexão com os tempos modernos da Alemanha. Uma curiosidade é que esta última pintura, em sites alemães especializados em arte, ela tanto é denominada como sendo de germanos (Germanen beim Würfelspiel) quando de Vikings (Ein Wikinger Spiel). Não conseguimos saber qual realmente é o título original, mas em todo caso indica que a tela pode ter sofrido alguma influência do pangermanismo oitocentista – onde as fronteiras culturais entre os germanos antigos e os Vikings eram muito tênues, sobrevivente na época em que a pintura foi realizada ou após a morte de Leeke, pelos sites especializados. Um tema para futuros pesquisadores em recepção nórdica na arte.



Bibliografia:


CÓRDOBA, Daniel Salinas. Vikings nas artes plásticas. In: LANGER, Johnni (Org.). Dicionário de História e Cultura da Era Viking. São Paulo: Hedra, 2017.

LANGER, Johnni. Estupro. In: LANGER, Johnni (Org.). Dicionário de História e Cultura da Era Viking. São Paulo: Hedra, 2017a.

LANGER, Johnni. Viking. In: LANGER, Johnni (Org.). Dicionário de História e Cultura da Era Viking. São Paulo: Hedra, 2017b.

Sites: